O Brasil ganhou cinco Copas do Mundo. Mas nunca ganhou um Prêmio Nobel. O Brasil ganhou oito campeonatos de Fórmula 1. Mas nenhum Nobel. Nunca ter recebido um Prêmio Nobel, a maior honraria científica, cultural, literária e tecnológica do mundo, significa que o Brasil é um excluído na área do conhecimento humano? Porque o Nobel nunca veio?
Vários brasileiros são reverenciados por suas invenções e trabalhos: o mineiro Alberto Santos Dumont (1873-1932) inventou o avião. O padre gaúcho Roberto Landell de Moura (1861 -1928) foi pioneiro na transmissão da voz humana sem fio. A abreugrafia é brasileira, inventada pelo médico paulista Manuel Dias de Abreu (1894-1962), que propiciou o diagnóstico de doenças como a tuberculose. O eletrotécnico mineiro-brasiliense Nélio José Nicolai (1940-2017) criou um sistema que permitia identificar chamadas de telefone. O padre paraibano João Francisco de Azevedo (1814-1880) teve a ideia de adaptar um piano de 24 teclas para que pudesse imprimir letras em papel. A Remington comprou a ideia e passou a fabricar a máquina de escrever.
O imunologista Vital Brazil, Mineiro da Campanha (1865-1950) criou o soro antiofídico. O médico e sanitarista Oswaldo Cruz (1872-1917), pioneiro no estudo das moléstias tropicais, quase chegou ao Prêmio Nobel. Os Irmãos Villas-Bôas, Orlando, Leonardo e Cláudio, chegaram a ser indicados ao Nobel da Paz pela defesa incontestável da causa indígena e criação do Parque do Xingu. Falou-se muito, também, num Nobel de Literatura para Guimarães Rosa (1908-1967) que revolucionou a literatura brasileira e provocou a atenção das elites intelectuais do mundo. Mas, mesmo assim, com histórico tão favorável à Humanidade, o Prêmio Nobel nunca chegou ao Brasil.
Sobre o Nobel de Literatura
A Academia Sueca se ocupa da seleção dos candidatos ao Nobel de Literatura e conta com 18 membros. O comitê do Nobel de Literatura, composto por quatro ou cinco membros, é o órgão que avalia as indicações e faz suas recomendações à Academia. Em outubro, os membros da Academia votam e o candidato que recebe mais da metade dos votos é nomeado o ganhador do Prêmio Nobel de Literatura. Ninguém pode obter o prêmio sem estar na lista pelo menos duas vezes, assim muitos dos mesmos autores reaparecem e são revisados repetidamente ao longo dos anos.
O processo de escolha do Nobel começa com os comitês de cada área, responsáveis pelo envio de cartas para cientistas, professores e acadêmicos de diversos países solicitando indicações para a premiação. Anualmente, os comitês recebem entre 200 e 300 indicados.
A cada outubro, mês em que acontece o maior encontro do ramo editorial do planeta, a Feira do Livro de Frankfurt, a Academia Sueca também anuncia o vencedor da mais prestigiada consagração literária internacional, o Prêmio Nobel. A Academia Sueca é a gestora, desde 1901, quando foi criado o fundo para a premiação, a partir da herança do cientista e inventor sueco Alfred Nobel (1833-96). Desde então, esta prática se repete todos os anos, com raras exceções, como no ano de 2018, em que não houve indicado por causa de problemas internos na Academia.
Todos os anos, cerca de 350 nomes de autores são indicados para a avaliação dos membros da academia, da qual sai uma seleção de 20 nomes, e depois uma nova fase onde chegam a 5 nomes e, dentre estes, será vencedor aquele que obtiver mais da metade dos votos. Como já houve casos em que a academia ficou dividida entre dois nomes, uma votação entre os dois sela a vitória.
O escritor laureado levará para casa, além da medalha de ouro e o diploma em papel – entregue pelo Rei da Suécia – 9 milhões de coroas suecas, o que equivale a aproximadamente R$ 4,5 milhões. Não é pouco.
O valor é pago pela Fundação Nobel que também concede prêmios em outras áreas como: Química, Física, Medicina ou Fisiologia e Paz. Há um prêmio em Economia, mas não é considerado como Nobel, apenas uma homenagem ao seu idealizador – Alfred Nobel.
Todos os prêmios são entregues em Estocolmo, no dia 10 de dezembro de cada ano, com exceção do prêmio da Paz* que é concedido pelo Comitê Norueguês do Nobel, em Oslo.
A França já foi contemplada com 15 escritores laureados. EUA e Inglaterra tiveram a honra 11 vezes. Os nossos vizinhos sul-americanos: Chile, Peru e Colômbia já sentiram a alegria de comemorar o Prêmio Nobel de Literatura. E, em 1998, José Saramago foi laureado com o Nobel, o primeiro a dado para algum escritor do idioma português.
A pergunta que todo leitor brasileiro se faz é: por que o Brasil nunca recebeu um Prêmio Nobel se todos os anos vários escritores brasileiros são indicados?
O problema começa com a revelação antecipada da indicação. De tempos em tempos, alguns grupos relacionados ao livro divulgam na imprensa a tentativa de promover ou inscrever um nome nacional para concorrer ao Nobel de Literatura. O erro tem início aí. A Academia Sueca tem por princípio, e está expresso no regulamento, excluir qualquer candidato se há uma campanha pública em seu nome. Divulgar uma proposição já desclassifica. Recentemente, houve campanhas públicas para a indicação dos nomes de Carlos Nejar e Lygia Fagundes Teles e isto já as tornaria inválidas.
Se quisermos ter um Nobel de Literatura será preciso desarticular qualquer pessoa que se arvore contra uma indicação de brasileiro, pois isso já derrubou várias indicações no passado. Embora estejamos num momento de extrema polarização política, o ambiente das Letras sempre foi especialista nessas artes: da intriga e difamação. O Brasil é reconhecido no exterior como o país em que há divisões mais radicais. Sempre que alguém é indicado, um grupo barulhento, que tem outros candidatos, tenta denegrir a obra para que aquele brasileiro não ganhe. Preferem que um brasileiro saia do páreo, que alguém que não é de sua preferência corra o risco de vencer.
Ozires Silva, que foi ministro da infraestrutura e fundador da Embraer, sempre se perguntava por que não havia um prêmio a algum brasileiro. Certa vez, estando num jantar na Academia Sueca, ele se viu diante da oportunidade de fazer a pergunta a três pessoas do comitê que indica os candidatos, e disparou: “Porque vocês nunca deram o prêmio a um brasileiro?”. Eles não responderam na hora, mas, próximo ao final do jantar um deles disse: “Vou responder a sua pergunta. Vocês brasileiros são destruidores de heróis. Toda vez que foi cogitado um nome brasileiro, fomos levantar a possibilidade e recebíamos muitas críticas ao nome, cartas virulentas difamando aquele nome. E isso em comparação a outros países, o Brasil sempre perdia, por divisão interna”.
Jorge Amado e Celso Furtado foram alguns dos nomes destacados no passado, mas que caíram pelos detratores. Ozires se encolheu na cadeira ao ouvir este relato e recordou das inúmeras vezes em que assistiu ao assassinato de reputações literárias por ciúmes, inveja, por discordância de pontos de vista ou por panelas. Realmente não valia a pena dar um prêmio a um escritor do país e ver que metade das pessoas da própria nação criticarem a escolha.
Não precisamos de guerras externas porque as criamos aqui dentro.